quinta-feira, 14 de maio de 2009

A maioria das pessoas encara o problema do amor como sendo uma questão de se ser amado, e não de amar, da capacidade de amar. Daí que, para elas, o problema consista em como ser amado, como ser agradável. (…)Uma segunda premissa por trás da atitude que defende que não há nada a aprender sobre o amor é a suposição de que o problema do amor é o problema de um objecto, e não um problema de uma faculdade. As pessoas pensam que amar é simples, mas que encontrar o objecto de amor certo – ou ser amado pela pessoa certa – é o mais difícil. (...)ter consciência de que o amor é uma arte, tal como a vida é uma arte; se queremos aprender a amar temos de fazer o que faríamos se quiséssemos aprender qualquer outra arte, como a música, a pintura, a carpintaria, ou a arte da medicina e da engenharia.
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O amor só é possível se as duas pessoas comunicarem a partir do centro das suas existências, ou seja, se cada um viver centrado na sua existência. A realidade humana não existe senão nesta “experiência central”; é nela que está a vida, é nela que está a base do amor. O amor, vivido desta forma, é um desafio constante: não é um refúgio mas antes um movimento, um crescimento, um trabalho em conjunto. A questão de haver conflito ou harmonia, tristeza ou alegria, é irrelevante em relação ao facto fundamental de duas pessoas viverem a partir da essência das suas existências, estarem unidas consigo mesmas e uma com a outra, e não estarem alienadas de si mesmas. Há apenas uma prova da existência do amor: a profundidade da relação e a vivacidade e a força de cada pessoa – é este o fruto através do qual se reconhece o amor.
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Ter fé requer coragem, a capacidade de correr riscos e de aceitar a dor e a desilusão. Quem insiste na segurança e na cautela como condições primárias para viver, é incapaz de ter fé; quem se isola num sistema de defesa, na segurança da possessividade e da distância, transforma-se num prisioneiro. Amar e ser amado requer coragem, a coragem de acreditar em certos valores – e de arriscar e apostar tudo nesses valores.
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A prática da fé e da coragem começa com os pequenos pormenores da vida quotidiana. O primeiro passo consiste em reparar onde e quando se perde a fé em algo ou em alguém, examinar as justificações que encobrem esta perda de fé, reconhecer quando se age com cobardia e reconhecer as formas como justificamos essas cobardias. (…)Só assim poderemos reconhecer que embora tenhamos, a nível consciente, medo de não ser amados, aquilo de que temos realmente medo, embora inconscientemente, é de amar.
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Hoje em dia, a maior parte das pessoas vive numa situação paradoxal: quando estão acordadas estão meio a dormir, estão meio acordadas. Estar totalmente acordado é a condição necessária para não estar, nem ser, aborrecido - e esta é uma das condições básicas para se amar. Ser activo ao longo do dia, em pensamentos e em sentimentos, com todos os sentidos e evitar a preguiça interior, quer seja uma preguiça receptiva, egoísta ou simplesmente uma perda de tempo, são condições indispensáveis para a prática da arte de amar. É uma ilusão pensar que se pode ser produtivo na esfera do amor e improdutivo em todos os outros domínios.
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O amor é uma actividade e não um afecto passivo; é um “estar” e não um “tornar-se”.
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Eric Fromm, A Arte de Amar, Pergaminho 2002

6 comentários:

  1. O amor é uma entrega, sim, um estar, mas como dizia a Marguerite Duras, para amar plenamente é preciso imaginação...Ha quem não tenha imaginação para amar. Gosto muito do que escreves sobre o amor.

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  2. Um dia, já aos quarenta e tantos anos de idade, quando passeava nas melancólicas margens do lago Albano, Stendhal resolveu sentar-se e, com a ponta da bengala, escrever na areia as inicias dos nomes de todas as amantes que tinha tido: A. G. B. K. L. M. C. R. V. D....- um extenso e enigmático alfabeto do amor! Stendhal pasmou...E tu? Não pasmarias também se te desses ao trabalho de te sentar nas margens da ribeira de Sta Luzia a escrever no alcatrão o teu alfabeto do teu amor? Mas não queres saber, não é?( ou então chegaste à conclusão que precisarias de toda a faixa direita desde o Bazar do Povo à Ponte Nova...),e estás a transformar-te num Valmont, o temivel 'vicomte' das 'Liaisons Dangereuses'! Perfumas as palavras, feres docemente os corações femininos e praticas o amor sem piedade, como quem pratica uma esgrima elegante e cruel! Monstruosa criatura!
    Deus tenha piedade das que caem na teia da tua sedução!
    (Só te perdoo por teres descoberto o polvo da badalhoca...)

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  3. Joana, o amor é uma entrega sim, mas temos que saber quem somos e o que somos, daí o estar, o ser quem realmente somos, e não o que nos dá jeito promover para o exterior. Ou as pessoas tomam consciência do que são, isso exige trabalho, ou o mais certo é estagnarem; se o seu coração não estiver activo, é como se estivessem mortas, apesar de ele continuar a bater.

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  4. JB, concordo com o que dizes e acredito na tua sinceridade, sinto que escreves com o coração, correndo riscos. É isso que me agrada no teu blog!
    Rui, não te esqueças que Valmont acaba por ser vítima do seu próprio jogo. No fim é o amor que vence (vencerá sempre!). Mas não vejo JB como um Valmont. Vejo sim um coração que se expande, num movimento cósmico e misterioso.

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  5. Minha cara Joana, não retiro uma virgula àquilo que disse do nosso amigo JB! Aproveito apenas para clarificar: JB é um Valmont do sec. XXI, um terrorista do amor! Já não usa o sabre nem o florete, ata um cinto de bombas ao coração e faz-se explodir junto da vítima, provocando estragos incomensuráveis! Como todos os terroristas, é uma fé cega que o move, a fé no Amor - esse Deus supremo por quem tudo sacrifica. É claro que se trata de uma explosão controlada (como não poderia deixar de ser para um Valmont). Quem sofre os ferimentos é quem está ao lado, com os estilhaços...

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  6. Tive que eliminar alguns comentários fora do contexto, redundantes e pessoais.
    Quanto aos textos do Rui Campos Matos trata-se de uma brincadeira, têm que ser lidos como tal, e têm a sua graça, por isso não os eliminei.

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