sexta-feira, 17 de abril de 2009




Com a minha mãe aprendi a gostar de livros, a adoptar as palavras como minha companhia, a descobrir segredos, enquanto o coração batia forte com as emoções de outros, que agora eram eu. Aprendi a gostar de cinema, daquele bailado de luzes e formas, a sentir as imagens a entrar dentro de mim, com a sua luz e magia. Aprendi a olhar para o mundo, como se eu não fizesse parte dele; a estar a salvo da proximidade dos outros, mesmo de algum carinho. Aprendi a apreciar a beleza, a pintura, a escultura, a arquitectura, com aquela tristeza e devoção de quem não poderá tocá-la. Aprendi a esconder a sensibilidade dentro de uma prisão, onde não poderemos receber visitas, mesmo de uma mãe ou de um irmão.

Mas gostava de lhe ter dito: O coração é como um Sol! Não conhece a Sombra, o Horizonte, o Infinito. O amor é como uma estrela, que às vezes, pica-nos, mas o seu brilho é tão intenso como a nossa alma! Queria tê-la libertado, desse sofrimento e angústia de querer tudo e mais aquilo, sem saber bem porquê! Na procura do Amor, de um Abraço, de um Sorriso, que preenchesse o vazio e o esquecimento. E abraçá-la como abraçam as árvores a terra e a lua, e beijá-la como beijam os pássaros as flores e os perfumes e senti-la mais mãe e eu mais filho, naturalmente, e respirar a alegria com um brilho incandescente nos olhos. Queria ter-te conhecido melhor, assim como revelar o que sou, Filhos e Pais tantas vezes surdos, cegos e mudos, construindo cada um o seu castelo de areia ou papel, tanto faz, cercados de muralhas e um mar de Amor que, entretanto, ficou por dar.
.
Agora que estás longe e eu não te posso chegar...
E dizer...
Só através deste sussurrar de sílabas
que rimam com poeira, céu e claridade.
....
Marc Chagall. Cirque, 1967, 43.2x32cm, Litografia, Museu Ermitage

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